Para Dom Roque, é preciso
combater toda incitação ao ódio e à violência contra os índios
O arcebispo
de Porto Velho (RO) e presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi),
dom Roque Paloschi, falou ao episcopado brasileiro, durante
a 54ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB), em Aparecida, entre os dias 6 e 15 de abril, que é preciso
combater toda incitação ao ódio e à violência contra os índios, lembrando que a
missão do organismo é “promover caminhos de fraternidade, de paz, de verdade”.
Dom Roque
Paloschi apresentou os desafios e perseguições que o Cimi tem
enfrentado. No tempo da Páscoa, lembrou da vitória de Cristo sobre a morte,
após sua paixão e morte na cruz. “Em nosso Brasil, os povos indígenas continuam
sendo flagelados e crucificados. Do alto das cruzes erguidas neste solo pátrio
nossos irmãos e irmãs gritam por vida. Não podemos celebrar a Páscoa, a
Ressurreição do Senhor, tapando os ouvidos e cerrando os olhos diante do
sofrimento que já dura séculos”, afirmou o bispo.
“As
violências e violações contra os povos indígenas e seus direitos aumentaram de
modo vertiginoso nos últimos anos”, apontou o presidente do Cimi. O arcebispo
revelou que setores político econômicos anti-indígenas atuam fortemente no
âmbito dos Três Poderes da República e pretendem implementar ações
estruturantes e sistemáticas contra os povos.
Ataques nos
Três Poderes
No âmbito do
poder Legislativo, projetos que tramitam no Congresso Nacional “visam bloquear
o acesso dos povos a direitos fundamentais à terra tradicional e ao ambiente
protegido e equilibrado”, como a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215,
que passa a atribuição para demarcação de terras aos parlamentares, e o projeto
de Lei 1610/96, que regulamenta e viabiliza a mineração em terras indígenas por
parte de grandes mineradoras nacionais e multinacionais. Essas são as
principais “armas manejadas pela bancada ruralista e da mineração nesta
perspectiva”, de acordo com o relatório. “Este ataque tem exigido dos povos
presença permanente junto ao Congresso Nacional a fim de evitar retrocessos
históricos contra seus direitos”, disse.
Tais
bancadas e grupos relacionados ao agronegócio e mineradoras buscam impedir o
reconhecimento e a demarcação das terras tradicionais que continuam invadidas,
na posse de não índios; e invadir, explorar e mercantilizar as terras
demarcadas, que estão na posse e sendo preservadas pelos povos.
A estratégia
da criminalização do Cimi também é implementada por meio da CPI da FUNAI/INCRA.
Dom Roque contou que “recentemente a bancada ruralista aprovou requerimento
determinando a instauração de mais um inquérito policial, agora para investigar
a atuação de nossos missionários junto a comunidades indígenas no estado do Rio
Grande do Sul”. “O Cimi é acusado pelos mesmos deputados flagrados em discursos
de explícita incitação ao ódio e à violência contra os povos naquele estado”,
aponta.
No poder
Judiciário, decisões põem em risco a posse de terras indígenas após a
Constituição de 88. Segundo dom Roque Paloschi, embora o artigo 232 da CF
estabeleça que os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas
para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, nunca houve
intimação destes, os quais também “não são parte em qualquer dos processos
judiciais que resultaram na anulação de atos administrativos de demarcação de
terras indígenas, mesmo tendo seus direitos frontalmente atingidos no âmbito
desses processos”.
No
Executivo, “a paralisação dos procedimentos de demarcação das terras indígenas
fora do contexto amazônico impera como ‘decisão de governo’”, afirma dom
Roque.
No mesmo
âmbito, a Fundação Nacional do Índio (Funai) passa por um “longo e profundo
processo de desidratação orçamentária e de pessoal”, segundo o Cimi. Essa
situação “inviabiliza a implementação de muitas das suas responsabilidades
institucionais”.
Atenção à
saúde indígena, sob a responsabilidade do Ministério da Saúde, “provoca um caos
generalizado no atendimento às comunidades”. Uma das consequências mais danosas
para os povos é a elevadíssima incidência de mortalidade na infância, de acordo
com o Cimi, que contabilizou, em 2014, 785 crianças indígenas mortas antes dos cinco
anos.
Perseguições
Alguns dos
casos “mais emblemáticos”, segundo dom Roque, acontecem na Bahia, com
comunidades dos povos Pataxó e Tupinambá; no Rio Grande do Sul e em Santa
Catarina, com crianças do povo Kaingang; no Maranhão, com madeireiros invadindo
terras já demarcadas dos povos Guajajara, Ka´apor, Awá Guajá; em Rondônia, Mato
Grosso e sul do Amazonas, onde grileiros e madeireiros avançam e loteiam terras
indígenas sob a justificativa de que a PEC 215/00 deverá ser aprovada pelo
Congresso Nacional; no Mato Grosso do Sul, com ataques paraestatais contra
famílias Guarani e Kaiowá.
No Mato
Grosso do Sul, os casos ganharam proporções internacionais e têm participação
direta de parlamentares que, inclusive, instalaram na assembleia legislativa do
estado a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Cimi, que já foi apontada
como uma iniciativa que tem por objetivo “desviar o foco dos debates sobre os
conflitos de terra que envolvem fazendeiros e indígenas”.
A CPI
do Cimi na Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul “é mais um dos
instrumentos de ataque usado contra a ação missionária da Igreja Católica junto
aos povos indígenas”, explicou dom Roque. No dia 13 de abril o bispo teve que
se ausentar do encontro episcopal, pois foi convocado para depor à
Comissão.
“As
perseguições, as ameaças, os ataques que o Cimi e nossos missionários sofrem
cotidianamente mostram que estamos trilhando o caminho certo, pois o próprio
Senhor Jesus chamou de bem-aventurados ‘os que são perseguidos por causa da
justiça’, prometendo-lhes o “Reino dos Céus”, refletiu.
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